quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Quatro

Eles deram as mãos e caminharam pelo areal sujo, naquele último dia de Verão. Estavam cegos. Cegos de não verem mais do que os olhos um do outro, por entre a neblina ténue daquela tarde de sol. Então, no olhar, traziam apenas a cegueira de acreditarem que o mundo podia parar e fazê-los serem melhores do que eram. Para serem um do outro. Talvez.
Atiraram-se ao chão e ficaram a ver o mar, com os pés nus enterrados na areia fria. E o mar era distante e bravo. Tão distante e bravo como o Inverno que se acercava a passos largos, subtil mas arrebatadoramente.
Sorriram. Sorriram como todos os amantes tristes fazem nos romances cor-de-rosa. Olharam um para o outro, com a timidez que sabiam que seria vencida, para poderem sentar-se mais perto. Para poderem cair no erro de fingirem que podiam amar-se mais do que se amavam, naquele segundo.
A medo, ele desenhou um coração na areia e ela sorriu, enquanto se levantava e recuava, aos poucos, antes de correr o mais que conseguia. O rapaz correu atrás dela, alcançando-a, sem dificuldade, e selando aquele momento com o primeiro beijo. E o primeiro beijo não foi mais do que o primeiro numa contagem decrescente para a morte do amor.
Quatro. Quatro beijos. Quatro dias. Quatro séculos. Quatro milénios. O amor morre. Morre como uma criança arrogante que decide, do nada, que não quer viver mais. Mas as pegadas estão marcadas na areia sólida da mente de ambos, lado a lado com o coração perfeito que ele desenhou para a rapariga, sem saber que enterrava ali o coração dela, para sempre.

Marina Ferraz

*imagem retirada da Internet

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